Um antigo mito hebreu versa sobre a possibilidade, através da ciência oculta da Cabala, de criar, com palavras mágicas, terracota e água uma criatura que será servo do homem que lhe deu a vida. À essa criatura, se dá o nome de Golem. Conta a tradição que o desfecho do mais famosos do Golens não foi dos melhores: na cidade de Praga, o kabalista Rabbi Loew percebeu que, quanto mais o Golem lhe servia, maior ficava em tamanho. Com o passar do tempo, as proporções que a criatura mágica atingiu ultrapassaram em muito o que era simplesmente constrangedor e se tornaram proporções perigosas, destruíndo árvores por onde passava, espantando animais e outros humanos.
Nesse momento da história, o rabino, cansado dos problemas causados pelo Golem, resolve tirar-lhe a vida (o grande segredo para a criação de Golens é escrever a palavra EMET na sua testa de barro), apagando a primeira letra da palavra mágica, transformando EMET (verdade) em MET (morte). Nesse momento, o Golem volta a ser apenas um amontoado de terracota, quebra-se com o próprio peso e cai sobre o rabino, matando-o imediatamente.
Essa história, uma das mais ricas do imaginário hebreu, tem sido muito utilizada como parábola para o modo que o homem trata a tecnologia de forma desmesurada, levando à sua própria destruição. Pode ser também muito bem adaptada para em relação aos modos de produção. Mas vamos falar sobre uma outra versão da história, menos conhecida.
Publicada pelo historiador arábico Cid Hamete Berengeli, em idos do século 19, a história muda de direção no seu final: quando o rabino percebe o desastre iminente no crescimento desproporcional do Golem, ele reflete e assume como saída mais sensata, além de dar a vida, dar razão e autonomia à criatura. Através de um novo ritual, no qual é amputado o dedo mínimo da mão esquerda, onde imeditamente apaga-se toda a palavra sagrada de sua testa, o Golem está livre e procura seu próprio caminho no mundo, buscando relações justas com todo seu entorno.
Além da certeza de 3 anos de felicidade de criatura (confirmada por uma visita ao Rabbi em algum dia do mês ocidental de agosto), não existem muitos detalhes sobre o que aconteceu, apenas algumas versões conflitantes. Mas uma coisa fica clara: o automato (agora uma pessoa de barro) pára de crescer e, assim como o rabino, continua sua vida sem a promessa da glória com o grande crescimento, mas pleno de felicidade.
Essa versão alternativa da parábola serve como representação de um desejo, certamente de difícil conquista, de um mundo longe do conto de fadas do crescimento contínuo que Condorcet chamava de progresso.
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